


Segundo Curnonski, o príncipe da gastronomia francesa, um cara que devia ser muito divertido, mas também segundo Raigorodsky, príncipe ocasional – pois às vezes nas fantasias de minha neta, viro príncipe, filho dela, a rainha – a harmonia começa entre os vinhos a serem servidos. A sequência cromática cabia perfeitamente, mas decidi por começar com o rosé de Bordeaux, mesmo que muito mais encorpado do que seus parentes famosos da Provence. Continuamos pelo Douro branco, o Quinta da Mieira, um branco com estrutura de petit chablis e fechamos com um despretensioso – mas nem por isso descartável, muito pelo contrário – Fleurie servido a menos de 14 graus centígrados.
Harmonia mesmo se dá, antes de tudo, entre as pessoas, o ambiente, a música, os ingredientes da comida, os pratos e seus complementos, o vinho entre eles, por mais que possamos – à maneira do Veronelli – comer para combinar com o vinho e não vice-versa.
Pessoas que querem se ver e se encontrar harmonizam qualquer coisa que seja servida, como foi o caso que relato.
Não que a comida não tivesse seu lugar, pois se tratava de um grupo globetroter, gente que já rodou por aí, viveu por aí, entre Londres, Paris, Milão e NY. Mas a vontade de se encontrar harmonizaria com salsichas cozidas ao molho de mostarda, mesmo que não fosse Dijon…
Além do que está ilustrado ao longo deste post, servimos um outro pratinho com uma espécie de taramá salad com ovas de um hering defumado um tanto quanto passado, mas que fez a nossa cabeça, gostoso que estava. Uma punheta feita de aparas de bacalhau, cebola, brócolos cozidos com ricota fazia introduzia os pratos com o peixe centro das atenções do jantar.
E servimos, complementando as entradas da Grande Bouffe – pois tinha comida para ao menos o triplo dos convivas – um misto de berinjelas e cebola.
Servimos então uma brandade regada a azeite de trufas branca, com o perdão do Gero Fasano, que acha este ingrediente reles pequeno-burguês; e um outro bacalhau apenas cozido no vapor, peças de bacalhau e dentes de alho num andar, couve e ovos no andar de cima, batata e cebola na água que fervia embaixo do edifício de divisórias de bambu, além do sempre presente arroz branco de resistência.
Evidentemente, estavam lá para qualquer uso mais urgente, o prato de queijo formado de sobras sempre na geladeira para qualquer eventualidade – um bleu alemão, um pedaço de cabra holandês, um pedaço de gruyère PJ, um outro de parmesão Scala Ouro…
A falta de sobremesas na casa foi suprida a tempo por um bolo enorme de chocolate e um excelente sorvete de pistache.
PS – apesar de não parecer possível, todos chegaram ao dia seguinte em boas condições de saúde.