O mundo gira e a toscana roda

Ambroglio

Até onde sei, os inventores dos vinhos do Novo Mundo no Velho Mundo foram os toscanos, a partir do braço-de-ferro entre o Antinori e a Denominação de Origem Chianti. O cuidado em não afirmar que foi assim que se deu, é justificado pela quantidade de vezes que é preciso reparar uma afirmação definitiva, particularmente no mundo do vinho. Por exemplo, o mundo se acostumou a dar ouvidos ao dito que Don Perignon teria inventado o vinho espumante, quando hoje se sabe que em Limoux – 100 anos antes – já se usava a técnica, depois chamada de champenoise…

Mais do que vinhos excepcionais como Tignanello, Sassicaia e Solaia, Antinori com a ajuda fundamental do seu enólogo Cotarella (atualmente proprietário da Falesco de Umbria e Lazio, consultor internacional), abriu a porteira para desautorizar os 200 e tantos DOCs e mais outros tantos DOCGs da região, mostrando que um vinho fora dos padrões de produção regional poderia ser um vinho de mais cuidado e mais afinado do que um que fosse controlado por qualquer denominação, bem no centro do universo do vinho europeu, cheio de regras sisudas.

CAMPO-AL-MARE-BAIA-AL-VENTO_product_thumbMais do que desautorizar as mil e uma regras das denominações locais, criou o mundo mais do que perfeito para o consumidor de vinhos italianos mundo afora. “Ah, você quer um vinho feito da forma tradicional, como seu pai costumava servir em casa? Leve então um grande vinho, um Chianti Classico, um Barbaresco, um Amarone. Ah, não é o caso, em casa todos gostam de vinhos mais modernos, como os do Novo Mundo? Então melhor ainda, pois os melhores fora da França são os italianos de Bolgheri e redondezas, na mesma toscana”. Ou seja, um prato cheio para os vendedores de vinhos italianos nos EUA, na Austrália e até no Brasil, seguidos logo depois dos tradicionais importadores Inglaterra e Alemanha.

Antinori criou seguidores em toda a Itália e trouxe para as suas terras fortes competidores, gente com a musculatura do campeão da América do Norte, o incansável Gaja, com seus Promis e Ca Marcanda e outros menos famosos fora da Bota, como os vênetos Ambroglio & Giovanni Folonari, que ingressaram no mundo do vinho no século XVIII, e que desde 1912 fincara bandeira na na Toscana, comprando a internacionalmente conhecida Azienda Ruffino, uma fonte de recursos infindável a partir de seus chianti in fiasco, governo toscano, que tanto frequentou as farras domingueiras das famílias egressas da Itália em todo Novo Mundo!

IL-PARETONo entanto, nem só de vinhos fora das denominações vivem os toscanos, pois a burocracia criada em torno das Denominações seria fadada ao desastre caso não houvesse qualidade, personalidade e… Seguidores, consumidores fiéis. É aí que os vinhos toscanos se destacam de tantos outros seguidores do Novo Mundo no Velho Mundo, suas uvas autóctones, seus métodos tradicionais de produção local têm lenha para queimar, principalmente depois que se submeteram aos avanços da enologia moderna.

Por isso, ao lado do sucesso indiscutível dos grandes vinhos feitos com uvas francesas, os vinhos com as variedades de Sangiovese continuam fazendo história. Pois dificilmente algum vinho no mundo se compara a um bom Chianti Classico, a um grande Brunello di Montalcino, a um Nobile di Montepulciano, ou a um – recentemente reconhecido pelo mercado internacional – Morelino di Scansano.

La FugaSeguindo uma tendência regional Ambroglio & Giovanni Folonari é fruto desta preocupação com qualidade, que se consolidou apenas depois dos anos 1970 e igualmente fruto desta confusão entre vinhos com DOC ou DOCg e vinhos feitos a partir de uvas francesas. Entre outros, produz em Bogheri um DOC Baia Al Vento (R$160,00), de boa qualidade, que contrapõe a um típico IGT super-toscano, o Cabreo (?), feito a partir de Sangiovese e Cabernet Sauvignon.

Tem o Il Pareto 100% Cabernet Sauvignon (R$350,00), vindo do centro da Toscana, Greve in Chianti, um vinho com afinamento em carvalho francês por mais de 16 meses. Um campeão, que nasceu 3 bichiere do Gambero Rosso e continua assim. Os louros não se restringem a Itália, pois suas notas para com os americanos são igualmente ótimas, 93 para o WS e para o RP, se bem que em safras diferentes (degustei o 2009, enquanto que 2007 e 2010 respectivamente para os dois veículos americanos citados)

Tem o La Fuga, Brunello di Montalcino (R$340,00) com 36 meses de bote de 3000 litros de carvalho da Eslavonia , um vinho com vinificação extremamente tradicional, mas com oxigenação e battonage diária, o que lhe deu suavidade e domínio sobre os taninos de modo precoce, pois falo de um vinho de 2008, que não tem um ano de engarrafamento e já está pronto para cair na farra. Para esta safra, a WS deu 91 pontos, enquanto que a WE deu 93.

Vinhos caros, mesmo na Itália, vinhos que seguem este nicho de consumidores que se consolidou no mundo e que excitou investidores por todo canto onde se produz vinho. Competem com a nata dos vinhos de diversas origens e frequentam adegas onde antes conviviam, até o fim do século passado apenas bordeaux, borgognes, baroli, amaroni, brunelli, côte rotie, Vega Sicilia, Barca Velha e Grange.

Fico com o último dos vinhos apresentados aqui, não porque os outrosp não sejam bons, muito pelo contrário. São grandes vinhos, o melhor que se pode fazer com cabernet sauvignon e merlot, mas quero crer que de cabernets e merlots o mundo está pleno, nesta altura do campeonato. De grandes sangioveses, apesar de não serem tão pouco assim, não.

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