Wine In em petit comitê

No dia 23 de julho, o raio caiu de novo no mesmo lugar – o DNA99 Pizzato 2008 e o Lote 43 Miolo 2011, aguentaram firme a comparação com os prestigiadissimos Errazuriz Carmenere Single Vineyard 2010, Achaval Ferrer Malbec e Clos de los Siete.

Fim de festa
Fim de festa

Ou seja, um merlot que bem representa o potencial do Vale dos Vinhedos; um corte bordalês básico de merlot e cabernet sauvignon que vem surpreendendo os detratores do vinho brasileiro há mais de uma década; um carmenère que está longe dos Ventisqueros simples, a meio caminho de um Clos de Apalta; um malbec misterioso, cujo nariz libertou-se em violeta e alcaçuz para fixar-se em uma ameixa ainda com o tom de alcaçuz presente; e um ícone do Michel Rolland, o vinho que compõe a pequena lista de produtos da América Latina recomendada vivamente pelo caderno de vinho do Le Monde.

Naquele dia de agosto de 2013, na primeira edição do Wine In, em dois júris simultâneos um com a presença de vinte profissionais do vinho – dos quais 10 brasileiros e 10 vindos da UCDavis, da Califórnia, do Merriot de Hong Kong, do Gamberorosso piemontês, de Bordeaux, de Toronto etc. –  e outro com 30 degustadores amadores, mas nem por isso menos experientes, o resultado foi parecido. Estes cinco pularam adiante dos adversários, com uma única mudança, o Errazuriz não era o mesmo, era um vinho mais simples, o básico Cabernet Sauvignon.

Desta vez, éramos 13 degustadores, entre nós, a Daniela Bravin nossa convidada especial.

Os outros, velhos companheiros de taça – a maioria participante de um grupo que se reuniu mensalmente entre 2011 e 2013 – quando demos uma volta ao Velho Mundo do vinho, passando oito meses na França, outro tanto na Italia e o resto na Espanha.

20 encontros depois, sempre regados a vinhos representativos de suas regiões, reproduzimos o duelo que mais fez para tornar o Wine In num evento conhecido.

O local, o La Frontera com seu estilo Francis Mallmann, que tanto me agrada, até porque sou sócio (minoritaríssimo) da casa, diretamente interessado em fazer coisas lá.

O método de comparação, aquele que implantei desde o começo, o único que respeito de fato, gastronômico que sou em relação aos vinhos – uma degustação de produtos similares em algum aspecto (regionalidade, uva, corte, preço, afinamento etc.) às cegas sem comida, um segundo turno de notas e avaliações com comida harmonizada, para finalmente acabar num papo acalorado sobre os gostos e impressões, com os rótulos escancarados e as surpresas referentes.

SEM COMIDA

No nosso caso, na primeira passagem, o grande campeão foi o DNA99, sendo consensual que era o mais equilibrado, o melhor na sua potência, e, ao mesmo tempo, na sua complexidade. Agradou imediatamente a todos, saltando na frente e se mantendo alguns corpos adiante do resto da turma. Ao contrário, e surpreendentemente – ao menos para mim – o Lote43 foi visto como um vinho de pouco nariz de final decadente, provavelmente porque foi influenciado pelos perfumes muitos mais presentes, particularmente nos dois primeiros do teste, o Errazuriz Carmenere e o Achaval Ferrer Malbec.

De cara, o exotismo do Achaval Ferrer Malbec criou imediato estranhamento, dividindo opiniões – uns detestaram, outros ficaram encantados, tentando descobrir que vinho era aquele, delicado, aromático, mas definitivamente irreconhecível com seu afinamento extremamente bem feito, deixando um retro-gosto de alta complexidade e longo. Foi a amostra que ocasionou as principais discussões.

O Errazuriz também foi muito polemico, bem avaliado por uma parte considerável do pessoal, mas seu carmenere muito escancarado revelou-se, depois de uma meia dúzia de goles, um atributo negativo, pois sua complexidade ficou comprometida por tamanha exposição de frutas, num painel em que a regra era a elegância.

Não entusiasmou o meu predileto, o Clos de los Siete, igualmente prejudicado, como o Lote 43, por serem os últimos e no entanto, por terem um nariz muito menos acentuado, a ponto de ter merecido o comentário negativo de um dos presentes – ” Este vinho não tem nariz”

COM COMIDA

Aqui o Errazuriz foi o que mais se deu mal, mesmo sendo a dita comida agnolotti com ragu de rabada e paleta de cordeiro. Digo, ” mesmo sendo.. IMG_0460.” porque os sommelier de plantão na maioria das churrascarias, empurram estas uvas como malbec e carmenere para os comensais, achando que seu excesso de doce e álcool são a salvação para quem come excesso de sal e gordura. Corrigem excessos com outros excessos e não deixam de ter seguidores, entre os quais não me incluo.

O Lote 43 então, nasceu das cinzas, tornou-se uma unanimidade, mas mais do que ele, seu vizinho, o Clos de los Siete! Não tiraram o DNA99 do pedestal, mas chegaram perto.

Outro que se transformou totalmente foi o Achaval Ferrer, agora menos floral, menos alcaçuz e mais ameixa. Sempre muito elegante, nem sempre foi tao bem avaliado.

MINHAS CONCLUSÕES

Evidentemente, todos os vinhos eram bons, de alto nível. Restou como sempre a surpresa pela qualidade dos brasileiros, mal avaliados mesmo entre consumidores mais atentos como estes.

Restou a certeza de que o veredicto com comida foi mais consistente e interessante do que o anterior.

Restou a magia da transformação do vinho exposto ao ar, responsável direto pelo abrir-se do Lote43 e do Clos de los Siete, assim como pela mudança impressionante do Achaval Ferrer.

Restou finalmente a certeza de que as provas as cegas valem para combinar opiniões e jogar por terra boa parte dos preconceitos.

Da minha parte, serviu para me aproximar do malbec. Os maiores que tomei eram realmente bons, aqueles que custam acima do que posso pagar, como foram os caso fantásticos do Nicolas Catena Zapata e do inesquecível Familia Marguery de anos atras, que degustei por gentileza das importadoras Mistral e VienaStore respectivamente. Mas os que estavam abaixo desses, mesmo alguns de alta qualidade como os Cobos, os da Goulart, nunca me encantaram totalmente… Idem para os Finca La Linda, Suzana Balbo etc. Produtores que, ao contrário, fazem grandes vinhos com outras uvas ou quando o Malbec entra apenas como vinho de corte.

Neste Achaval Ferrer notei uma coisa inédita – uma leveza que jamais tinha visto em vinho algum feito nos Andes argentinos. Não é a toa que muita gente enxerga na Achaval o que se faz de melhor nas terras platinas!

Quanto aos brasileiros, não destoei da grande maioria, votei no DNA99, apesar de concordar em parte com alguma critica que o considerou ” certinho demais” . Para um vinho brasileiro, taxado ate’ poucos anos como um vinho que jamais chegaria aos bons consumidores, confrontado a vinhos extremamente pontuados pelo mundo do vinho, ser ” certinho demais” e’ um baita elogio!!!

Votei igualmente no Lote43, que se mostrou com tal elegância que surpreendeu ate os mais experientes entre nos, com sua complexidade, fineza e elegância. Um grande vinho também, marcante exatamente por ser contido em seus atributos.

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