O que ando fazendo além de beber

pinot-grigioProcuro Pinot Grigio, uva que se deu particularmente bem em Bolzano, oficialmente Trento-Alto Adige italiana desde o inicio da Primeira Guerra Mundial, esta região tirolesa onde as línguas oficiais são – não apenas o italiano e o alemão – mas, em parte de seu território, o ladino.

bolzano

 

Muito louco. Esta uva é a mesma Pinot Gris da Alsácia, é a Grauburgunder germânica, mas só no Alto-Adige galga os pícaros da gloria mercadológica.

socialSuspeito que ocupe um lugar no modismo das uvas que cansam a boca. Não me refiro à sauvignon blanc, quando na fronteira entre o Loire e a Borgonha, nem me refiro à sauvignon blanc quando – solitária ou misturada com a semillon e eventualmente com a muscadelle – cria maravilhas de mesa e de sobremesa lá pelos interiores de Graves, na Bordeaux oriental. Mas sim, falo um pouco desta bebida rápida, fresca e cítrica que associamos à pouco preço, Nova Zelândia, Casablanca, peixes levinhos.

ugelNada contra, muito pelo contrário, eu também sou consumidor assíduo, desta ou daquela. Mas me enche um pouco o saco, como enche mais do que pouco, ver gente mundo afora fazendo pesados chardonnay, tentando chegar onde só se chega em Montrachet.

Quando na França – já devo ter contado – pedia sempre nos bares de Paris um balon d’Alsace, mais interessante, quase sempre, que o balon de rouge, as alternativas que restavam ao estudante sem grana que costumava ser. Dentre os d’Alsace, comumente a uva servida era a Silvaner, majoritariamente era uma mistura de silvaner e pinot gris e raramente apenas pinot gris (mais raramente ainda, riesling e gewurzstraminer, uvas nobres demais para serem servidas assim, a pouco preço).

Então ela já estava lá, é o conjunto, é a prova que a uva não é a uva, mas o jeito de fazer, a combinação com a terra e com o clima, a importância que o vinicultor dá para aquela cepa, para aquela safra.trimbach

Como ela, muitas outras, tantas. O que dizer da Bonarda, quase medíocre no Piemonte, obnubilada por tantas outras como a Barbera, a Dolcetto e principalmente a Nebbiolo; totalmente medíocre por décadas na Argentina, apesar de ser ótima para corte e quantidade de suco por planta… E que de repente começa a ser bem tratada, passa por processos nobres de vinificação e floresce, vê-se com qualidade, mostra-se toda, perde o recato. Mais que ela, a Barbera, sempre fiel escudeira e então, plantada em região de grande nobreza – entre La Mora e Barolo – vira longeva, ganha concentração e tudo mais.

Já vimos tantas vezes este filme. Lembra-se da Zifandel e de sua irmã Primitivo, como eram quando as conhecemos 30 anos atrás? Ralas, frescas, parentes – digamos – em uso, preço e jeitão, com as Bardolino da vida. De repente, saem voando em garrafas pesadas, com alto teor alcóolico e importância, superam a casa dos US30$ a unidade, entram nas adegas importantes. É a ação renovadora do marketing que especula seriamente e sistematicamente com os novos horizontes enológicos.

grauburgunderPois vinho é mercadoria ao chegar na gôndola. Como tudo trabalha com um misto de renovação e gosto constituído. Um novo chianti clássico, traz a região e o gosto pre-concebido, pré-rejeito/pré-aceito.  É apenas mais um, que por preço promocional, rótulo chamativo ou indicação do especialista, chama atenção do consumidor. Tem um forte ponto de partida. O mesmo vale para os cabernet sauvignon, merlot, Malbec, Carmenerre, Chardonnay e Tempranillo da vida. O comprador não quer muita novidade, quer um pouco mais do mesmo, sabe o que espera e se for mais econômico e melhor apresentado ótimo, está mais de bom!

Outra coisa é vir como eu vim, com um quase extinto Rufete, que se dá ao luxo de ser embalado por um ano num allier de tosta fina, vindo dos cafundós da Beira Interior, tímida região entre as pujantes Extremadura, Alentejo e além fronteira com a Espanha, onde esta junta-se às Jaen e outras para ser uva binacional. Pegar uma Rabigato, como é? Fazê-la atriz maior de um branco do Douro, quando já não são tão presentes os consagrados brancos da região do Porto?

O mercado reclama pelo mesmo, mas reclama pelo diferente, em menor medida mas com igual ou maior pujança.

A nossa pinot Grigio nunca será uma Riesling, jamais uma Alvarinho – que pulou fora do Minho para se tornar única. Mas na condição de complemento de mercado, vai se dando bem, verões afora no cinco continentes. Parente secundária da grande Pinot Noir (quem é protagonista perante ela?), vai trilhando um bel camino a partir desta ponta da Bota!

 

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