Venho tentando me entender no complexo agro-industrial, econômico, político, histórico, antropológico e social mundo do vinho. O vinho vai do plantar até o setor de serviços, envolvendo centenas de profissões e atividades. Vira-e-mexe me dá uma necessidade de chafurdar informações, cruzar certezas, inspecionar. Esta série (este é o segundo capítulo) produzo para publicar na decana Vinho & Cia.
PARA EN![]() As transformações no tempo e as Denominações de Origem Controlada 1ª Parte – Boa e Ruim – Hoje o negócio vinho é feito por profissionais espalhados por toda a cadeia de produção e circulação, desde o capital investido, eventualmente sem qualquer contato com a terra que produz, até o comerciante, que talvez jamais tenha bebido uma taça de vinho, porque basta o aval dos Robert Parker da esquina para vaticinar se o produto é bom ou não. Antes o vinho popular era produzido junto com outros produtos voltados para o consumo interno, nada mais que um alimento líquido, presente nas mesas familiares, o que lhe dava um ar de coisa rural, simples, tranquilo como a massa e o azeite, como os embutidos e o queijo que se produzia em casa. Note-se que a população rural era maior do que a urbana nos países do Ocidente, o que significa dizer que até os anos 1970 dificilmente alguém que morava na cidade não tinha um parente ou uma propriedade produtiva no campo. Isso era certeza nos países das penínsulas Ibérica e Itálica, na França, Suíça, Holanda, Bélgica, Alemanha.
2ª Parte – Ruim e Boa – Hoje são seguidos princípios enológicos muito mais precisos do que antes dos anos 1980, quando a revolução enológica Peynot invadiu a produção, com suas inovações técnicas, com as medidas de açúcar potencial da uva, com sua micro-oxigenação, com a indução da segunda fermentação (malolática) antes do descanso em madeira, aço ou garrafa. Questões como as de terroir, saíram do plano místico e puderam ser perfeitamente decupadas, dando um verdadeiro e científico lugar àquilo que é de fato específico a cada vinho – pois as condições ideais de clima + solo + água + uva + técnica de produção foram destrinchadas suficientemente para se reproduzirem quase à vontade por todo o Novo Mundo, e mesmo por boa parte do Velho Mundo, que não se atrevia a tanto. Hoje vinhos bordaleses, tão bons quanto os de Bordeaux, são produzidos na Califórnia, na Austrália, na Toscana e em tantos outros lugares – incluindo o Brasil –, entendendo-se por bom aquilo que os vinhos de Bordeaux atingiram em matéria de qualidade. No entanto, as velhas técnicas, pela observação dos produtores, pelo gosto dos consumidores, consolidaram uma escala de confiabilidade e prazer traduzida por alguns rótulos místicos que ganharam corpo com o passar dos anos, tornando-se referências de tudo o que veio depois. As técnicas modernas se apropriaram da estética (Latu sensu) dos vinhos antigos, ou seja, foram atrás de suas uvas, de sua extração, de sua madeira de guarda, de seu tempo de encorpar e conseguiram imitá-los. Neste contexto, voltamos ao nosso ponto – as Denominações de Origem. Elas foram e continuam sendo, em parte, um guia de qu Para a França – cuja aristocracia da Borgonha tinha a supremacia mais que centenária – os grandes vinhos eram os da região, particularmente entre Beaune e Dijon, com prevalência para os da Côte de Nuits. Na Itália da pré-reunificação os únicos vinhos produzidos no país eram da região do Langhe piemontês, preferencialmente de Barolo. Desde os tempos da Império Grego associava-se os vinhos de uma região à qualidade. Ah, aquele vinho é da Enotria (atual Itália), para além de Roma. Ah, aquele vinho Ou seja, a Denominação de Origem foi criada para garantir qualidade e, com isso, eternizar um mercado para os vinhos produzidos na região reconhecida. Evidentemente, com o crescimento do mercado, com a internacionalização dos consumidores, isso se tornou mais difícil, até porque muitos deles decepcionavam e tantos deles exigiam uma verdadeira enciclopédia para localizá-los. Vamos continuar o assunto? Anuncio para o próximo artigo mais do mesmo: partes ruins e boas. |